segunda-feira, 30 de abril de 2018

Duros tempos

Penso muito sobre os tempos que estamos vivendo. Pergunto e pesquiso quais seriam os piores momentos da humanidade no planeta água? As dificuldades que a história apresenta em suas linhas são as mais variadas, as mais diversas. Seríamos de fato, como algumas teorias explanam uma experiência fracassada? Se formos, pobre de nós, humanidade. São perguntas que me inquietam. São pensamentos que não cessam, pelo contrário, estão cada vez mais presentes e me deixam, confesso, preocupado. São tempos mistifórios. Poucas pessoas estão ligadas em energias, em sensibilidades. Possuímos uma camada que nos cerca invisíveis aos olhos de muitos que ocupam esse solo. Há uma egrégora que somos todos responsáveis em construir e manter. Nós interferimos nela, assim como, ela interfere em todos nós. Indiscutivelmente não estamos investindo boas energias nessa camada, pobre de nós, humanidade. Tenho percebido. As frequências que estamos vibrando estão desviadas. São acontecimentos que falam em línguas ininteligíveis e apontam com dedos ditadores nossos erros e nos castigam, sem nenhum traço de benevolência. Será que pensamos tanto em nós mesmos que não somos mais capazes de nos conectamos aos nossos instintos mais ancestrais? Estamos encrostados em nosso pobre podre coração modificado por nossas trocas genéticas. Perdemos o que tínhamos de mais valioso. Nos perdemos de nós mesmos, pobre de nós, humanidade. 

sábado, 31 de março de 2018

Un peu d'ail

Hoje plantei minhas sementes. Coloquei minhas mãos na terra. Com meus dedos revolvi até o ponto de deixá-la bem aerada. Depois, aos poucos, fui umedecendo. Não com lágrimas, pois há um boato que lágrimas são salgadas e não seriam um começo bom para meus filhotes. Precisei com fé procurar por água rica, límpida como agora são meus sonhos. Encontrei água que ajudará as meninas sementes germinarem. Encontrei uma água justa, como sou agora, apenas água. Me libertei, me misturei. Depois deste evento era possível sentir o cheiro fresco do barro do vaso que abraçava a terra. Há braços que não sentiremos mais. Abraços que dão forçam para que brotemos. O protocolo foi cumprido com sucesso. Agora resta esperar pelo tempo. As meninas garotas estão enterradas, soterradas, solitárias, veladas por um centímetro de terra, como era indicado pelo protocolo. Chegará o dia que também estarei enterrado, soterrado, solitário, velado por um centímetro de terra. Terei também cumprido meu protocolo. Contudo diferente de mim, elas, as gurias pujantes, depois que o senhor tempo passar darão origem a belas novas vidas que podem ser belas folhagens verdes. São hoje o futuro enterrado de uma vida nova enquanto eu serei apenas memória de um dente de alho prateado envolto em uma palma de ouro.

quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Apenas mais uma confidencialidade entre nós

Não era mais o passado, mas revivemos o passado. Vivemos bons ruins momentos juntos. Somos muito próximos e essa dificuldade de querer aproveitar o outro, abrir minutos de possibilidades, torneiras de cascatas e nos sentir bem com conversas quase muda por obrigação. Confidenciei, depois de sua pergunta, que não tenho mais um coração no peito e sim um buraco vazio. Um buraco que foi esvaziado de um coração, pois na vida as boas coisas vem banhadas do gosto de ferro do sangue. Logo, sem sangue para pulsar o coração é um órgão que cai em desuso a não ser pela função poética de verminar o amor pelo corpo. É por isso que hoje desejo que 'ele alguém' que apenas nós sabemos morra. É tão bom sentir esse ódio incontrolável e desejar a morte desse 'alguém' que nós sabemos em segredo. É por isso que nós gostamos de brindar com latas de coca-cola do tamanho exato de um copo, para evitarmos os excessos. Luzes sobre nossas taças egoístas que nosso abraço sela. Será que foi um jogo do destino nos reencontrarmos depois de andar pelo espaço? Não. Moramos na mesma vizinhança e mesmo que eu torça para o Coritiba e você para o Vasco somos cúmplices de um crime hediondo. 

quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

O velho tempo

Você já viu o tempo? Foi essa a pergunta que aquele velho senhor fez. E eu frente a ela silenciei. Pensei que tempo jovem é companheiro. Quando passa velho tempo é saudade. Tempo é sol mas também pode ser chuva. O tempo venta. Tempo bom é aquele que não volta pois escorre fugindo como rio manso, nem notamos. Tem aquele que corre ligeiro e parece até bicho bravo solto em mato novo. Alguns serpenteiam perigosamente, prestes a dar o bote. Outros apenas passam. Nesse tempo frente ao tempo senti que quando ele chega é hora de dizer adeus, quem sabe receber um abraço. Foi aí que notei: meu tempo tinha acabado. O velho senhor nem mais ali estava. Havia ele se transformado em tempo?

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

Viperino és tu

Contudo há de existir a ruptura. E mesmo que de forma antecipada para mim, não para você, consigo ver muito mais colorido. Hoje, os meus olhos são os mesmos mas as minhas sinapses cérebro-visuais como mudaram. Parece até coisa de alteração química, e é. Era preciso. Agulhas também ajudam a sustentar um grande animal congelado de asas abertas prontas para decolar pausado com um clique fotográfico mais flash e depois jogado para além sul. Eu, romântico que sou, sofro de amor e percebo que seus calcanhares de Aquiles têm asas carimbadas com viperino. Ben Jor J já escreveu que homens também amam mas os meninos não são capazes de viver o amor. Minha cabeça está salvaguardada, protegida de laranja, intocada. Já você está exposto.

quinta-feira, 30 de novembro de 2017

Janela

A noite é fria. Estou como costumeiramente fico, sozinho em casa. Nenhuma companhia. Nenhum barulho. Meus únicos aliados são os diversos travesseiros que estão espalhados pela minha cama e os dois que apoiam minha cabeça para formarem um ângulo perfeito para o meu vício da leitura. Estou confortavelmente encasulado em meu cobertor. O movimento repetitivo de meus olhos da esquerda para direita em ritmo frenético é quase automático. Termino de ler mais uma vez meu autor preferido, Álvares de Azevedo. Dessa vez devorei Noite na Taverna em dois dias. Eu sempre me surpreendo com cada nova leitura. Acho encantador a forma que ele descreve todo o ambiente que envolve a história. Os personagens são tão fascinantes que consigo me envolver com eles, posso dizer que são meus amigos. Por vezes, assumo que na maioria delas, suas conversas, suas dúvidas e suas teorias me convencem. Consigo até sentir o aroma que a taverna exalava. É realmente uma viagem transcendente. Contudo meus pensamentos me derrubam. Retomo a consciência ainda deitado na cama com o livro fechado sobre minha barriga, subindo e descendo com minha respiração. Em noites de frio como esta nada melhor para um solitário que uma caneca de café bem quente. - Ótima ideia! – exclamo para mim mesmo. Na cozinha coloco a água para ferver. Preparo meticulosamente todos os utensílios. Apenas abro mão do açúcar. Com minha caneca cheia de café liberando uma névoa sensual de fumaça retorno para meu quarto onde resolvo me sentar à mesa e imergir em outro mundo, o virtual. Mundo este que me encanta, me faz passar dias a fio buscando informações e fazendo milhares de outras coisas ao mesmo tempo. Sempre gostei dessa conectividade e a tecnologia me encanta cada vez mais quando descubro novas funcionalidades para aparelhos que são lançados e tornam-se obsoletos tão rápido quanto o por do sol. Esse dia, porém, estava diferente. Algo estava fora do que costumeiramente era rotina. Não que os site não estivessem no ar, os e-mails não chegassem ao seu destino ou as redes sociais estivem mornas. Tudo funcionava perfeitamente. Esse algo que incomodava era em mim, como uma cocheira que a gente não alcança. E se tudo estava tão estranho eu resolvi assumir essa posição. Resolvi experimentar e entrei em um desses chats que milhares de pessoas participam. Nada que acontecia me apetecia. Conversas vazias com pessoas desconhecidas, algumas insuportavelmente chatas, outras completamente loucas, algumas ainda tremendamente inconvenientes. Conversas essas que começavam e terminavam sem nenhum sentido. Embora não fosse tarde já era noite. Já me preparava para desligar o computador, levar minha caneca de café de volta para cozinha e embarcar em um sono tranqüilo que apenas os inocentes podem ter. Faria isso tudo se não fosse surpreendido pelo barulho de uma janela de diálogo subindo crepitante pela tela de meu monitor. Nunce pensei que as coisas passariam a ser tão diferentes depois deste simples fato de olhar através desta janela que se abria...

terça-feira, 31 de outubro de 2017

Era mais um dia na praça

Já é quase noite, mas as luzes amarela-avermelhadas que clareiam a praça ainda não estão acessas. No banco um senhor, sentado, apenas contemplando. Um menino se aproxima.

Menino – Tio tem fogo?

Senhor Não fumo.

Menino Tem uma moeda?

Senhor – Não tenho.

Menino – Tem seda?

O senhor levanta e saca do bolso traseiro esquerdo um lenço de seda. Entrega para o menino que o olha sem entender.

Senhor – Pode ficar com ele. Logo estou voltando e tenho tantos outros guardados.

O menino segura o lenço. Continua sem entender. O senhor senta novamente, respira fundo e assovia. Confuso olha para um lado, para outro e pergunta para o menino que ainda está parado na sua frente, olhando para o lenço tentando entender.

Senhor – Você sabe se aqui tem algum ponto de encontro para cachorros perdidos?

O menino olha ainda mais confuso para o senhor.

Menino – O que?

Senhor – Hoje é a primeira vez que trago o Arte para passear. Receio que ele esteja perdido, pois nunca tinha caminhado por um cachorródromo. É a primeira vez que vejo um aqui na praça.

Menino – É a primeira vez que você vem na praça?

O senhor ri.

Senhor – Não, não... Eu já estive aqui várias vezes, mas toda vez que retorno a praça está completamente diferente então é como se fosse a primeira vez.

Menino – O senhor veio pela primeira vez na praça e deixou seu cachorro passear sozinho por um lugar que nem você conhece?

Senhor – Arte é um cachorro muito sagaz. Ele sempre reaparece, de uma forma ou de outra, sempre volta. Só não queria sair daqui porque quando eu voltar a praça já pode ser outra.

O menino com o lenço de seda na mão tem a cara cada vez mais confusa. Olha para o senhor e fala.

Menino – Meu, que viagem...

Senhor – Ah! Já ia me esquecendo... Você sabe por que o Arte chama Arte? Porque quando ele late parece que está gritando: Arte! Arte! Arte!

O menino não consegue segurar a gargalhada.

Menino – O senhor é muito louco...

Senhor – Pode me fazer um favor? Quando você encontrar o Arte diga que já voltei. Ele vai saber como me encontrar. É só você deixar ele farejar o lenço e saberá onde estou.

O menino ainda gargalha. O senhor saca um puncake do bolso da camisa e começa a usar. Em cada parte que ele passa ele desaparece. O menino se espanta e curioso se aproxima. Aos poucos só resta a boca do senhor que fala para o menino.

Senhor – Um dia você vai entender.

O Senhor some. O menino em choque se vira assim que o senhor se desfaz. A primeira coisa que ele vê é um grande cão grafitado na rampa que um skatista acabou de cair. Correndo em direção ao cão o menino coloca o lenço no focinho do cachorro que late: Arte! O sino da igreja toca 25 vezes.